Parlamento da Venezuela declara mandato de Maduro ilegítimo
Na estreia internacional do ministro brasileiro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, os chanceleres do Grupo de Lima, reunidos nesta sexta-feira (4), assinaram um documento em que acordaram em não reconhecer a "legitimidade do novo mandato" do ditador venezuelano, Nicolás Maduro, por considerar que as últimas eleições presidenciais, em maio, não contaram com as garantias necessárias de um pleito "livre, justo e transparente."
Neste sábado (5), o Parlamento venezuelano, controlado pela oposição, fez coro e também declarou que o novo mandato de Maduro é ilegítimo.
"Reafirmamos a ilegitimidade de Nicolás Maduro (...). A partir de 10 de janeiro, estará usurpando a Presidência e, consequentemente, esta Assembleia Nacional é a única representação legítima do povo", disse o novo presidente do Legislativo, Juan Guaidó, ao tomar posse. Ele foi escolhido por unanimidade para o cargo, conforme o portal G1.
Diante da ampla bancada da oposição e de representantes do corpo diplomático, Guaidó também se comprometeu a "gerar as condições para um governo de transição e convocar eleições livres".
"A presidência não está desocupada, está sendo usurpada (...), estamos na ditadura", afirmou o deputado do Vontade Popular, partido de Leopoldo López, em prisão domiciliar.
Vitorioso no pleito de 20 de maio último, Maduro começa o segundo mandato, que vai de 2019 a 2025, no próximo dia 10, em meio a uma grave crise econômica.
Grupo Lima
Ainda sobre a reunião do Grupo Lima, o México foi o único dos 14 países presentes que não assinou o documento. Firmaram o mesmo os representantes de Argentina, Brasil, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Guatemala, Guiana, Honduras, Panamá, Paraguai, Peru e Santa Lúcia.
O texto aponta que "as eleições do último dia 20 de maio carecem de legitimidade por não ter contado com a participação de todos os atores políticos venezuelanos, nem com a presença de observadores internacionais independentes". Além disso, pedem que Maduro não assuma a Presidência em 10 de janeiro e que "transfira à Assembleia Nacional, em caráter provisório, o Poder Executivo para que esta realize novas eleições presidenciais democráticas".
Rechaçam, porém, intervenções estrangeiras com a "convicção de que a solução da crise corresponde aos venezuelanos". Em 2017, o presidente dos EUA, Donald Trump, disse que não descartava uma "opção militar" contra Maduro.
Os países signatários reforçaram que seguem dando "pleno respaldo à Assembleia Nacional, eleita de modo legítimo em 6 de dezembro de 2015". Este órgão, de maioria opositora, tem sido esvaziado de suas funções, reúne-se apenas quando a Assembleia Constituinte, também não reconhecida pelo Grupo de Lima e outros membros da comunidade internacional, não está em sessão e, o que decide, não chega a virar lei. Na prática, é a Assembleia Constituinte quem toma as decisões legislativas e eleitorais.
O documento ainda pede "respeito à integridade, à autonomia e à independência do Supremo Tribunal de Justiça", hoje também esvaziado e com vários membros fora do país.
Condenam também, de modo "inequívoco e firme a ruptura da ordem constitucional e do Estado de Direito na Venezuela", para que se possam resolver as causas da "crise política, econômica, social e humanitária" no país.
Por fim, pedem a que todos os países-membros da OEA (Organização dos Estados Americanos) reafirmem seu apoio à Carta Democrática Interamericana e condenam qualquer ameaça de Maduro de "ameaçar a paz e a segurança da região".
Com relação à crise humanitária e à saída massiva de venezuelanos do país, o texto diz que os países signatários "reiteram sua profunda preocupação pela grave crise" e diz que a mesma é consequência dos "atos e políticas antidemocráticas, opressoras e ditatoriais praticados pelo regime".
Renovaram, ainda, o compromisso de seguir dando assistência aos migrantes e que irão "promover e desenvolver iniciativas de coordenação regional para dar uma resposta a essa crise humanitária".
No que diz respeito a ações mais práticas, os signatários acordaram em "reavaliar o estado de suas relações diplomáticas com a Venezuela", além de impedir altos funcionários do regime de entrar nos territórios dos países do grupo e elaborar listas de pessoas físicas ou jurídicas que não poderão entrar. Dependendo de alguns casos, inclusive, devem considerar "congelar seus fundos e outros ativos ou recursos econômicos".
O secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, participou por teleconferência.Em nota, a coordenadora de programas da ONG Conectas Direitos Humanos, Camila Asano, elogiou o documento.
"A Declaração do Grupo de Lima acerta ao reafirmar a carência de legitimidade das eleições que levaram Maduro ao novo mandato e ao fazer um chamado para que a ordem constitucional seja restabelecida por meio da convocação de novas eleições presidenciais. Ao mesmo tempo, rechaça qualquer tentativa de intervenção militar externa e ratifica o compromisso com a acolhida de migrantes e solicitantes de refúgio de forma articulada na região."
Depois do anúncio do documento, feito pelo chanceler peruano, Néstor Popolizio, o ministro venezuelano das Relações Exteriores, Jorge Arreaza respondeu: "O que afirmamos desde a criação deste grupo de governos cartelizados contra a Venezuela, ao qual em teoria não pertence o governo dos EUA, é que se reúnem para receber ordens de Donald Trump: que demonstração de humilhante subordinação", escreveu Arreaza.
Pela manhã, o presidente colombiano, Iván Duque, declarou que esperava que o Grupo de Lima chegasse a um texto "enfático e que desconheça o novo mandato de Nicolás Maduro" e que outros países se unissem à demanda instaurada contra o ditador junto a Corte Interamericana de Direitos Humanos.
A vice-presidente venezuelana, Delcy Rodríguez, atacou as declaracoes de Iván Duque, dizendo por meio das redes sociais que o presidente colombiano demonstrava "profunda ignorância que finalmente sai à luz pública e permite entender os vergonhosos níveis de subordinação com relação a Washington. A dignidade colombiana hoje foi manchada por suas oligarquias e governantes".
O México, que teve uma postura crítica durante o mandato de Enrique Peña Nieto, vem mudando de posição desde a posse do esquerdista Andrés Manuel López Obrador.
O atual líder mexicano convidou Maduro para a cerimônia em que assumiu a Presidência, no último 1º de dezembro, e nesta sexta não subscreveu o documento do Grupo de Lima.